Após a superquarta, dia em que bancos centrais do Brasil e dos Estados Unidos alteraram seus juros, o diferencial das taxas entre os dois países cresceu.
Enquanto a taxa Selic foi elevada em 0,25 ponto percentual, a 10,75%, a faixa norte-americana caiu em 0,5 ponto, para a margem de 4,75% a 5%.
Essa diferença tende a tornar os ativos brasileiros mais atraentes para o investidor estrangeiro, em um movimento chamado de diferencial de juros.
A lógica é que taxas mais elevadas pagam melhores remunerações. Então vale a pena alocar nesses países o dinheiro mais barato, obtido com juros menores, em outro.
Com a entrada de dólares no Brasil, o fluxo de capital tende a valorizar o real. Aqui, o que se faz valer é a lei da oferta e da demanda: quanto mais moeda estrangeira é alocada em um país, mais ela se deprecia ante a divisa local.
E esse movimento de valorização já vinha sendo observado antes da decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), com movimento de antecipação de posições dos investidores.
Até quinta-feira (19), o dólar vinha de uma sequência de sete pregões em queda, acumulando desvalorização de 4,14% ante o real, batendo a marca de R$ 5,42.
A tendência, porém, não se manteve nos pregões seguintes. Já na sexta (20), o dólar disparou 1,78%, encerrando a R$ 5,52.
O movimento para cima se manteve nesta segunda-feira (23), com a divisa norte-americana subindo 0,26%, a R$ 5,53.
Por trás da alta estavam temores do mercado em relação às contas públicas, que refletem na piora das expectativas para a inflação e previsão do mercado de mais alta dos juros.
“O movimento do dólar ainda é reflexo da revisão da Selic, mas principalmente da revisão de alta dos juros e de alta do próprio PIB. Internamente, a gente observa dados de trabalho e inflação, mas o aspecto fiscal está sendo bem observado neste momento, inclusive pelo Haddad”, aponta Paloma Lopes, economista da Valor Investimentos.
“Já existem indícios, até pelas próprias conversas entre Haddad e Lula, que algo no fiscal terá que ser feito para controlar a inflação”, conclui.
Para Berenice Damke, especialista em câmbio e professora da Damke Consultoria e Treinamento, ainda é prematuro ver a cotação do dólar engatar uma sequência de quedas que tragam a cotação para próximo de R$ 5.
“O diferencial de juros deve favorecer a valorização do real, mas outros fatores também influenciam este cenário como, por exemplo, o apetite a risco nos mercados globais, o comportamento da economia e as incertezas políticas no Brasil”, diz.
No caso de sexta, o temor girava em torno do atraso na divulgação do Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias do 4º Bimestre de 2024.
O movimento do governo foi visto como um sintoma da dificuldade em relação ao equilíbrio das contas públicas para cumprir a meta de déficit zero este ano. Desse modo, os ganhos expressivos que vinham sendo observados se reverteram.
“Você já teve uma tendência importante de valorização nas últimas semanas, já antevendo esse aumento de diferencial, prevendo que o investimento vai render mais no Brasil do que lá fora, mas tem a questão fiscal que atrapalha”, aponta José Márcio Camargo, economista chefe da Genial Investimentos.
No fim das contas, o governo acabou anunciando um novo bloqueio de R$ 2,1 bilhões nas contas públicas, totalizando corte de R$ 13,3 bilhões no orçamento federal. Porém, o relatório apontou reversão dos R$ 3,8 bilhões contingenciados em julho, apontando aumento nas receitas.
A medida foi mal recebida pelo mercado, que avaliou como insuficiente a contenção. Ao longo da sessão, os olhos estavam voltados para a coletiva de imprensa dos Ministérios da Fazenda e do Planejamento, na qual explicaram o relatório.
O secretário executivo do Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO), Gustavo Guimarães, afirmou que a reversão do bloqueio orçamentário de R$ 13,3 bilhões é “muito difícil” de acontecer.
Camargo aponta que com os gastos emergenciais realizados em decorrência das enchentes no Rio Grande do Sul e das queimadas pelo país, a tendência é a dívida aumentar, podendo chegar a mais de 85,7% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2026.
Os economistas ouvidos pela CNN apontam que é difícil de cravar um valor exato para a cotação do dólar, por conta das outras variáveis também envolvidas no cálculo.
Paula Zogbi, gerente de research e head de conteúdo da Nomad, cita ainda o ritmo de futuros cortes nos EUA, além do desempenho da maior economia do mundo e eleições previstas para novembro.
“O aumento do diferencial de juros tem uma forte tendência a, tudo mais constante, trazer fluxo financeiro para o país e, com isso, seguir valorizando nossa moeda, mas boa parte desse movimento já foi antecipada pelo mercado”, diz.
“Sendo assim, considerando todo o cenário e os riscos mencionados, para o investidor o ideal é seguir comprando dólares e investindo internacionalmente em busca de um preço médio e das melhores oportunidades de diversificação de portfólio.”
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